Compartilhamos o artigo da advogada do Vieira Ceneviva, Dra. Izabel Cristina, em coautoria com a Dra Arlete Aurelli, publicado no portal Processualistas, sobre a multa do Agravo Interno, conforme regramento do Novo Código de Processo Civil.
A multa do agravo interno X a necessidade de esgotamento das vias ordinárias para a interposição dos recursos excepcionais
Como é sabido, a interposição dos recursos extraordinário e especial está condicionada ao esgotamento das instâncias ordinárias. Em função disso, buscaremos, no presente artigo, confrontar a necessidade da interposição do Agravo Interno para alcançar o esgotamento das vias ordinárias a fim de possibilitar a interposição do recurso especial e do recurso extraordinário e a previsão de aplicação de multa para os casos de recurso manifestamente inadmissível ou improcedente.
Conforme inteligência do caput do artigo 1.021 do CPC/2015, contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado. Ocorre que o novel diploma processual prevê também a condenação do agravante ao pagamento de uma multa ao agravado fixada entre 1% e 5% do valor atualizado da causa, quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime pelo órgão colegiado, em decisão fundamentada (art. 1.021, § 4º, CPC/2015).
Assim, verifica-se um agravamento na posição do agravante que é obrigado a interpor o agravo interno a fim de esgotar a instância necessária à interposição dos recursos extraordinários, mas se vê na contingência de vir a sofrer multa por isso.
No sistema anterior, (embora em percentual maior – de 1% a 10%) a multa era aplicada no caso de recurso de agravo manifestamente inadmissível ou infundado. Na verdade, parece uma modificação sem importância à primeira vista, mas, de fato, não o é. Entendemos que a alteração prejudica o jurisdicionado, porque mudou de infundado para improcedente. Infundado, na nossa visão, seria o recurso sem fundamento, apresentado apenas para protelar o trânsito em julgado da decisão. Já o recurso improcedente diz respeito ao mérito que, embora tenha sido fundamentado, não será capaz de alterar a decisão recorrida.
Sobre o impacto desta alteração, veremos mais adiante.
Importante salientar que, aplicada a multa, a interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor imposto, com exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final (art. 1.021, § 5º, CPC/2015).
Sobre o dito recurso, a comissão do Anteprojeto do Novo Código de Processo Civil [formada pelo Exmo. Ministro Luiz Fux, professora Teresa Arruda Alvim Wambier e outros tantos notáveis juristas] esclareceu que seria interessante dispor sobre hipóteses de cabimento dos recursos de agravo interno, ou de agravos regimentais. Claro que esse tema sempre é tratado como de resolução interna das cortes, mas não soaria ruim que já ficasse delimitado no Código hipóteses de não cabimento de agravos regimentais.
E, continuaram que, com isso teríamos uma tramitação mais rápida dos processos nas instâncias superiores, seja dos Tribunais de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e dos próprios Tribunais Superiores, facilitando com isso o fim do processo.
No final das discussões das várias versões do CPC[1], optou-se pela aplicação mais ampliativa, com a previsão de que contra toda decisão monocrática, proferida em qualquer Tribunal, caberá Agravo Interno para o órgão colegiado.
Embora não tenha constado do texto final a expressão “Ressalvadas as hipóteses expressamente previstas neste Código ou em lei”, a qual esteve presente em versões anteriores, é certo que não caberá o recurso em comento, quando houver expressa previsão de irrecorribilidade da decisão, como é o caso, por exemplo, da decisão que admitir o amicus curiae em grau recursal (art. 138), da manifestação de órgãos e entidades, no caso de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade (art. 650, § 3º) e quando o Supremo Tribunal Federal não conhecer do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral (art. 1035).
Sobre o tema específico do presente estudo, para que seja possível a interposição do recurso especial e/ou do recurso extraordinário, é necessário que sejam esgotadas todas as vias ordinárias, ou seja, que tenham sido interpostos todos os recursos cabíveis na instância inferior, para a abertura da via excepcional, por conta do disposto na Constituição Federal, nos artigos 102, III e 105, III quando estes referem-se às causas decididas em única ou última instância.
Além disso, temos a Súmula 281, STF, que dispõe: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando couber na Justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada.” E, também, inúmeras decisões do STJ no mesmo sentido.
Assim, ponderando a questão da multa prevista para o caso de recurso manifestamente improcedente e a necessidade de esgotar-se todas as vias ordinárias para a interposição de recurso especial e/ou extraordinário, verifica-se que tal multa será um empecilho para o jurisdicionado, que é obrigado a interpor o agravo interno para poder recorrer para os Tribunais Superiores, mas terá sempre a faca apontada para si ante o receio de que tenha seu agravo considerado manifestamente improcedente. E mais, no caso de deixar de apresentar o recurso de agravo interno, correrá o risco de não ter seu recurso excepcional conhecido, por lhe faltar o requisito de esgotamento das vias ordinárias.
Entendemos, pois, que tal alteração trazida pelo CPC/2015 (a multa do CPC para recurso manifestamente improcedente)é inconstitucional, porque fere o Princípio do Acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, CF) e o Princípio do Devido Legal (art. 5º, LIV, CF), haja vista a necessidade de esgotamento das vias ordinárias para a abertura da via excepcional, como dissemos.
Se tal disposição passar a ser aplicada, pura e simplesmente, o vencido, na maioria das vezes, terá tolhido o seu direito de recorrer (que decorre do direito de ação) às instâncias extraordinárias, ferindo de morte os princípios basilares citados.
Sobre o condicionamento do pagamento da multa à interposição de outro recurso, Cassio Scarpinella Bueno critica veementemente tal disposição, nos seguintes termos:
“Não critico a possibilidade de apenar o litigante de má-fé pelo abusivo exercício do direito de recorrer, muito pelo contrário. O que é intolerável é condicionar a interposição de qualquer outro recurso ao recolhimento prévio da multa, nos termos do § 5º do art. 1.021.
Ainda mais intolerável, a censura diante da exceção feita por aquele dispositivo ao permitir à Fazenda Pública e ao beneficiário da justiça gratuita o pagamento da multa a final. Considerando o motivo que autoriza a multa (em última análise, litigância de má-fé), nada há que permita justificar o tratamento diferenciado.
Seria melhor, em nome do princípio constitucional da isonomia, que todos estivessem sujeitos ao pagamento a final da multa (…).”
Ora, data vênia ao referido entendimento, pensamos que não se pode confundir o litigante de má-fé com a parte que, sucumbente, tem direito a ter seu recurso julgado pelas mais altas Cortes do nosso ordenamento jurídico.
Portanto, salvo melhor juízo, entendemos que a melhor interpretação sobre a questão em comento é a seguinte: o órgão julgador, ao analisar o Agravo Interno, mesmo que julgando-o improcedente por unanimidade, não deve aplicar a multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015, justamente porque é certo que o recorrente somente o faz porque é obrigado para preencher o requisito do esgotamento das vias ordinárias, necessário para a interposição do recurso especial e/ou extraordinário.
Se assim não for, entendemos que a alteração trazida pelo CPC/2015, com a troca de recurso infundado para recurso improcedente é inconstitucional, pois fere os Princípios Constitucionais do Acesso à Justiça e Devido Processo Legal.
Izabel Cristina Pinheiro C. Pantaleão Ferreira, Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP, professora convidada da pós-graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie e da Escola Superior de Advocacia, membro da ABDTIC – Associação Brasileira de Direito das Tecnologia, da Informação e das Comunicações, da Comissão de Direito das Telecomunicações da OAB/SP, do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados de Processo e da ABDPro – Associação Brasileira de Direito Processual, Advogada em São Paulo e
Arlete Inês Aurelli, Doutora e Mestre em Direito Processual Civil pela PUC/SP, professora de Direito Processual Civil nos cursos de graduação e pós-graduação stricto sensu da PUC/SP, membro do IBDP – Instituto Brasileiro de Direito Processual, do CEAPRO – Centro de Estudos Avançados de Processo e da ABDPro – Associação Brasileira de Direito Processual e advogada em São Paulo.
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Artigo publicado no portal Processualistas em: https://processualistas.jusbrasil.com.br/artigos/354373498/a-multa-do-agravo-interno-x-a-necessidade-de-esgotamento-das-vias-ordinarias-para-a-interposicao-dos-recursos-excepcionais. Acesso em 01 de dezembro de 2017.
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